Possibilidade de cisão de instituição sem fins lucrativos filantrópica

Possibilidade de cisão de instituição sem fins lucrativos filantrópica

Questão:

Solicito parecer quanto à possibilidade de uma cisão de uma entidade sem fins lucrativos, filantrópica.

Considerações sobre a questão:

A cisão é um instituto jurídico que pode ser utilizado por qualquer tipo de empresa, inclusive por associações sem fins de lucro e até mesmo filantrópicas. Pode ser total ou parcial, e está prevista na Lei nº 6.404/76, a partir do artigo 229:

Lei 6404/74 – Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

O parágrafo 1º desse artigo dispõe sobre a forma de sucessão das obrigações da instituição cindida. No caso de cisão total, quando ocorre a extinção da instituição, aquela que vier a absorver as parcelas do patrimônio líquido da instituição cindida sucederá a esta na proporção do patrimônio líquido transferido, ou seja, sucederá a instituição cindida nos direitos e obrigações referentes àquela determinada porção de patrimônio que foi transferida:

Lei 6404/74 – Art. 229 – § 1º Sem prejuízo do disposto no artigo 233, a sociedade que absorver parcela do patrimônio da companhia cindida sucede a esta nos direitos e obrigações relacionados no ato da cisão; no caso de cisão com extinção, as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados.

Na hipótese de cisão parcial, a situação é semelhante, todavia a instituição cindida permanece existindo. Desse modo, a sucessão de direitos e obrigações só se dará quanto à parcela de patrimônio que foi transferida à outra entidade.

Toda essa operação deverá ser deliberada pela assembleia geral; não obstante, o parágrafo 2º do Art. 229 determina que a assembleia deverá aprovar peritos que avaliarão a parcela do patrimônio a ser transferida na nova instituição:

Lei 6404/74 – Art. 229 – § 2º Na cisão com versão de parcela do patrimônio em sociedade nova, a operação será deliberada pela assembléia-geral da companhia à vista de justificação que incluirá as informações de que tratam os números do artigo 224; a assembléia, se a aprovar, nomeará os peritos que avaliarão a parcela do patrimônio a ser transferida, e funcionará como assembléia de constituição da nova companhia.

A maioria das entidades sem fins lucrativos que possuem o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas) quase sempre busca o processo de cisão, visando não só a proteção do patrimônio da instituição, como de seus associados, em função do rigor da fiscalização (SRFB, MPF e outros órgãos).

Destaque-se:

A Assembleia Geral dos associados, formada para o fim específico, deve dispor de forma clara dos motivos que estão levando à cisão e, assim, elaborará um protocolo e justificativas de intenção de cisão parcial, dos quais deverá constar (no mínimo):

  • os elementos de ativos e passivos que formarão cada parcela do patrimônio no caso de cisão;
  • os critérios de avaliação do patrimônio líquido, a data-base de sua avaliação e o tratamento das variações patrimoniais posteriores;
  • o valor do patrimônio líquido das entidades a serem criadas ou do aumento ou redução das entidades que forem parte na operação;
  • o projeto de estatuto, ou de alterações estatutárias, que deverão ser aprovados para efetivar a operação;
  • os motivos ou fins da operação e o interesse da entidade em sua efetivação;
  • a empresa que será contratada para elaboração do laudo de avaliação patrimonial (obrigatório);
  • todas as demais condições acordadas entre as partes.

Aspectos contábeis que devemos ainda destacar:

Primeiro, deve ser realizado um estudo de viabilidade econômico-financeira da instituição cindida e da nova instituição, com enfoque no princípio contábil da continuidade, para ambas as entidades.

Em ambos os tipos de cisão, seja ela total ou parcial, a contabilidade dará o devido tratamento para separar o que pertence às entidades dos interesses residuais de seus associados.

A Lei nº 9.249/95 descreve que, em um evento de cisão, o laudo técnico contábil deve demonstrar os bens e direitos da parte cindida, que serão avaliados pelo valor contábil ou de mercado:

Lei nº 9.249/95 – Art. 21. A pessoa jurídica que tiver parte ou todo o seu patrimônio absorvido em virtude de incorporação, fusão ou cisão deverá levantar balanço específico para esse fim, no qual os bens e direitos serão avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

§ 1º – O balanço a que se refere este artigo deverá ser levantado até 30 dias antes do evento.

§. 4º – A pessoa jurídica incorporada, fusionada ou cindida deverá apresentar a declaração de rendimentos correspondente ao período transcorrido durante o ano-calendário, em seu próprio nome, até o último dia útil do mês subsequente ao do evento.

Aspectos tributários

O departamento contábil da instituição cindida deve providenciar a apresentação das seguintes informações econômico-fiscais relativas ao evento de cisão.

– Escrituração Contábil Fiscal (ECF) – deverá ser entregue pelas pessoas jurídicas extintas, cindidas, fusionadas, incorporadas e incorporadoras, até o último dia útil do 3º (terceiro) mês subsequente ao do evento, exceto quando o evento tiver ocorrido de janeiro a abril do ano-calendário, cujo prazo será até o último dia útil do mês de julho do referido ano.

A obrigatoriedade de entrega da ECF, na forma prevista acima, não se aplica à incorporadora, nos casos em que as pessoas jurídicas, incorporadora e incorporada, estejam sob o mesmo controle societário desde o ano-calendário anterior ao do evento.

– Escrituração Contábil Digital (ECD) – nos casos de extinção da pessoa jurídica, cisão parcial, cisão total, fusão ou incorporação, a ECD deve ser entregue pela pessoa jurídica extinta, cindida, fusionada, incorporada e incorporadora, observados os seguintes prazos:

  1. se a operação for realizada no período compreendido entre janeiro a abril, a ECD deve ser entregue até o último dia útil do mês de maio daquele ano; e
  2. se a operação for realizada no período compreendido entre maio a dezembro, a ECD deve ser entregue até o último dia útil do mês subsequente ao do evento.

A obrigação prevista acima não se aplica à incorporadora nos casos em que esta e a incorporada estavam sob o mesmo controle societário desde o ano-calendário anterior ao do evento.

– Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) – deve ser apresentada até o 15º (décimo quinto) dia útil do 2º (segundo) mês subsequente ao de ocorrência dos fatos geradores. Essa regra aplica-se, inclusive, aos casos de extinção, incorporação, fusão e cisão total ou parcial.

Não se aplica à incorporadora, entretanto, nos casos em que esta e a incorporada estavam sob o mesmo controle societário desde o ano-calendário anterior ao do evento.

 – Declaração do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (DIRF), nos prazos e formas estabelecidos pela Instrução Normativa correspondente ao ano-calendário a que se referir.

Conclusão

Não há nada que impeça que uma instituição sem fins de lucro, filantrópica, possa ser cindida, total ou parcialmente. Há, contudo, que destacar que o CEBAS da instituição cindida não contemplará a nova instituição. Está terá que buscar, após um ano de trabalho efetivo, sua certificação.


Por. Dr. Ricardo Furtado, Consultor Jurídico, Educacional, Tributário, Humanista, especialistas em ciências jurídicas – 1/11/2020